Author
Harper Lee
Category
Novel
Format
Kindle
Language
Brazilian Portuguese
Pages
350
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Review

O Sol é Para Todos é uma viagem aos anos 1930 que tem, como pano de fundo, o dia do julgamento de Tom Robinson, um homem negro acusado de estupro na fictícia Maycomb, no segregado sul dos Estados Unidos.

A história é contada pela perspectiva de Jean Louise Finch, a Scout, uma esperta garotinha de 6 anos. Através das memórias da Scout, somos apresentados aos personagens dessa história, sempre acompanhadas de anedotas que você esperaria de uma criança dessa idade.

A rotina de aventuras, confusões e acidentes de Scout, seu irmão Jem e seu amigo Dill, prepara o leitor para o grande dia do julgamento. As interações das crianças com os moradores de Maycomb dão, ao leitor, a dimensão do racismo e da segregação existentes naquela sociedade.

O julgamento em si é um dos pontos altos da história, com um grande discurso de Atticus Finch (pai da protagonista), advogado da defesa, centrado na presunção de inocência ante a falta de provas.

Porém, a obra também é um produto de seu tempo. Publicada originalmente em 1960, todo o pano de fundo da questão racial avança graças aos elevados valores morais de Atticus, o benevolente homem branco “defensor de negros”. Praticamente inexiste iniciativa dos personagens negros vítimas das mazelas daquela sociedade. Calpurnia (a governanta negra da família Finch), por exemplo, apesar de ser claramente uma figura materna para Jem e Scout, é pouco desenvolvida na história.

Portanto, não leia esse livro achando que será uma grande obra contra o racismo (como frequentemente esse livro é referido). Esse é apenas o pano de fundo para o desenrolar de uma história sobre gente simples e suas vidas, contadas de forma vívida pela pequena protagonista.

O que dá para afirmar é que, ao terminar de ler O Sol é Para Todos, você terá conhecido uma das personagens mais fantásticas da literatura.

Some quotes

A srta. Caroline começou a aula lendo para nós uma história sobre gatos. Os gatos conversavam muito entre si, usavam roupinhas lindas e moravam numa casa acolhedora, embaixo do forno da cozinha. Quando a sra. Gato ligou para a lanchonete e pediu ratos de chocolate, a classe toda estava muito agitada, parecia um balde cheio de minhocas. A professora parecia não se dar conta de que seus alunos do primeiro ano, meninos e meninas que usavam roupas remendadas, camisas de brim e saias de saco de farinha, a maioria dos quais tinha colhido algodão e dado comida aos porcos desde que aprenderam a andar, eram imunes à literatura fantástica.


Eu não gostava de ler até o dia em que tive medo de não poder ler mais. Ninguém ama respirar.


Atticus se levantou e foi até a beira da varanda. Quando acabou de examinar as glicínias, voltou para o meu lado. — Em primeiro lugar, Scout — ele disse —, se aprender um truque simples, vai se relacionar melhor com todo o tipo de gente. Você só consegue entender uma pessoa de verdade quando vê as coisas do ponto de vista dela.


Tio Jack ergueu as sobrancelhas e não disse nada. Além da atração inerente àquelas palavras, eu estava colocando em prática a improvável teoria de que, se Atticus descobrisse que eu estava aprendendo palavrões na escola, não me deixaria mais ir.


Tia Alexandra era obcecada pelas minhas roupas. Como eu podia querer um dia ser uma mulher elegante usando suspensórios masculinos? Quando eu disse que usando vestido eu não conseguia fazer nada, ela retrucou que eu não devia fazer nada que exigisse calças compridas. Para ela, eu devia brincar de comidinha, servir chá num aparelho em miniatura e usar o pequeno colar de pérolas que ela me deu quando nasci. Além disso, eu deveria ser um raio de sol na vida solitária do meu pai. Respondi que qualquer pessoa podia ser um raio de sol mesmo usando calças compridas, mas minha tia disse que eu tinha de me comportar como um raio de sol também, que eu tinha nascido uma boa menina, mas ia piorando a cada ano.


— É. Mas depois não teria coragem de encarar os meus filhos. Você sabe o que vai acontecer tanto quanto eu, e espero que Jem e Scout passem por isso sem sofrimento e principalmente sem pegar essa doença tão comum em Maycomb. Como pessoas razoáveis ficam possessas quando se trata de qualquer coisa relacionada com um negro eu nunca vou entender… Só espero que Jem e Scout venham me procurar quando quiserem respostas em vez de ficarem dando ouvidos ao que se fala pela cidade. E que confiem em mim… Jean Louise?


Atticus não fazia nada. Trabalhava num escritório, e não numa farmácia. Não era motorista do caminhão de lixo do condado, não era xerife, não trabalhava no campo, não era mecânico, nem fazia nada que alguém pudesse admirar.


Mas antes de ser obrigado a viver com os outros, tenho de conviver comigo mesmo. A única coisa que não deve se curvar ao julgamento da maioria é a consciência de uma pessoa.


Coragem é fazer uma coisa mesmo estando derrotado antes de começar — prosseguiu Atticus. — E mesmo assim ir até o fim, apesar de tudo. Você raramente vai vencer, mas às vezes vai conseguir.


Ninguém precisa mostrar tudo que sabe. Não é educado. Em segundo lugar, as pessoas não gostam de quem sabe mais que eles. Incomoda. A gente não muda os outros falando direito, eles precisam querer aprender. E se não querem, o jeito é ficar calada ou falar como eles.


Em geral, as pessoas veem o que querem ver e ouvem o que querem ouvir (…)


— Senhores, serei breve, mas gostaria de usar o tempo que me resta para lembrá-los que este caso é simples, não exige o exame detalhado de fatos complexos, mas exige que os senhores tenham absoluta certeza da culpa do acusado. Para começar, este caso não deveria ter ido a julgamento. É tão simples quanto preto no branco. O Estado não produziu nenhuma prova médica do crime que Tom Robinson teria cometido. Confiou apenas no depoimento de duas testemunhas, cujas declarações foram seriamente questionadas durante o interrogatório e enfaticamente negadas pelo acusado. O réu não é culpado, mas alguém aqui neste tribunal é.


Sabemos, senhores, que se trata de uma mentira tão negra quanto a pele de Tom Robinson, uma mentira que não preciso explicar aos senhores. Os senhores sabem a verdade: alguns negros mentem, alguns negros são imorais, alguns negros não merecem a confiança de ficar perto das mulheres, sejam elas brancas ou negras. Mas essa verdade se aplica à raça humana, sem distinção. Não existe ninguém neste tribunal que nunca tenha mentido, que nunca tenha feito algo imoral, não existe um homem vivo que nunca tenha olhado para uma mulher com desejo.”


Atticus falava tão calmamente que a última palavra doeu no nosso ouvido. Olhei para cima e a expressão no rosto dele era de veemência. — Para mim não há nada mais repugnante do que um branco de quinta categoria tirar vantagem da ignorância de um negro. Podem ter certeza: essa dívida está aumentando e um dia vamos pagar essa conta. Espero que até lá vocês já tenham morrido.


Mas todo mundo tem que aprender, ninguém nasce sabendo. Walter é muito inteligente, ele só se atrasa na escola porque tem que ajudar o pai. Não tem nada de errado com ele. Olha, Jem, eu acho que só existe um tipo de gente: gente.